Em anos recentes, o doutor Philip Goulder tem se dedicado a uma ideia fascinante: as crianças poderiam ser a resposta para a busca de uma cura eficaz e generalizada contra o HIV. Desde meados dos anos 2010, ele trabalhou com cientistas na província sul-africana de KwaZulu-Natal, acompanhando centenas de crianças que contrairam o vírus da AIDS durante a gravidez, parto ou aleitamento materno.
Após colocar essas crianças em antirretrovirais desde muito cedo para controlar o HIV, Goulder e seus colegas notaram algo inusitado: cinco crianças pararam de comparecer aos consultórios, mas estavam em perfeito estado de saúde meses depois. 'Em vez de terem cargas virais elevadas, elas eram indetectáveis', disse Goulder. Em um estudo publicado recentemente, ele descobriu que essas crianças permaneceram em remissão, mesmo sem receber medicamentos antirretrovirais por longos períodos.
Esses achados sugerem que a primeira cura amplamente eficaz para o HIV pode vir de crianças, não de adultos. Em uma conferência recente sobre AIDS, Alfredo Tagarro, pediatra em Madri, apresentou um estudo mostrando que cerca de 5% das crianças infectadas pelo HIV que recebem antirretrovirais nos primeiros seis meses de vida conseguem suprimir os reservatórios virais. 'As crianças têm características imunológicas especiais que tornam mais provável que desenvolvamos uma cura para elas antes de outros grupos', disse Tagarro.
Segundo Goulder, crianças tendem a ter sistemas imunitários dinâmicos e não enfrentam problemas como hipertensão ou doenças renais, o que as torna alvos mais promissores para uma cura. Ele lançou um novo estudo para entender melhor esse fenômeno, selecionando 19 crianças na África do Sul que suprimiram o HIV significativamente após a interrupção dos medicamentos.
Os resultados iniciais indicam que seis delas conseguiram controlar o vírus sem medicação por mais de 18 meses. Goulder especula que fatores como a imunidade innate e flutuações hormonais, especialmente no sexo masculino, possam estar ligados ao sucesso.
Enquanto isso, cientistas como Maurico Martins estão explorando tratamentos genéticos que enviam instruções para células musculares produzirem anticorpos neutralizantes em larga escala. Essa abordagem poderia ser especialmente útil em países com alto índice de transmissão do HIV.
Embora crianças ainda representem uma minoria das infecções pelo HIV, aprender a curá-las pode oferecer insights cruciais para o tratamento de adultos também. 'Podemos aprender muito com elas porque são diferentes', afirma Goulder. 'Se seguirmos por este caminho, podemos alcançar um tratamento definitivo tanto em crianças quanto em adultos.'