Jérôme Peignot: A Vida de um Tipógrafo que Resistiu à História

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Quando falamos de tipografia, raramente pensamos em uma vida inteira dedicada à arte da impressão. Jérôme Peignot, que faleceu recentemente aos 99 anos, foi um desses seres raros que transformou a letra miúda de um livro em uma jornada pessoal contra o tempo e a história.


Nascido em Paris em 1926, filho de Suzanne Peignot, ligada ao grupo dos Six, e Charles Peignot, herdeiro de uma longa linhagem de tipógrafos, Jérôme herdou não apenas um negócio, mas uma missão. Sua infância foi marcada pelo aprendizado da arte da impressão, mas sua adolescência foi um campo de batalha contra a compreensão do mundo que o cercava.


Como muitos jovens na França ocupada, Jérôme teve que decidir onde estava seu lugar. Ainda estudante, recusou-se a cumprimentar Pierre Drieu la Rochelle, um escritor colaboracionista que seu pai orgulhosamente apresentou a ele. "Não aperto mão de alguém que veio de assinar um 'Hino ao Soldado Alemão' em Gringoire", disse ele, com a firmeza de quem já sabia o preço das palavras.


Essa atitude não foi recebida com agrado. Seu pai, furioso, lhe deu uma bofetada que, segundo Jérôme, foi apenas um incentivo para ele se engajar ainda mais na Resistência. Foi assim que ele passou a ser parte do movimento que lutava contra o regime nazista, mesclando a tipografia com a coragem.


Depois da guerra, Peignot seguiu seu caminho acadêmico, estudando na Escola Estienne e concluindo uma licença em estética na Sorbonne. Sua tese de mestrado sobre caligrafia latina foi apenas o começo de um longo percurso intelectual que culminou com um doutorado 30 anos depois.


Enquanto trabalhava na edição, Peignot encontrou tempo para escrever. Sua obra, marcada por um forte componente autobiográfico, incluiu livros como "L'Or des Fous", que lhe valeu o prêmio Sainte-Beuve em 1962. Essa premiação não foi apenas uma homenagem à sua escrita, mas também um reconhecimento de que a tipografia era mais do que linhas e letras: era história, resistência e identidade.


A morte de Jérôme Peignot fecha um capítulo de uma vida dedicada à arte e à luta. Ele provou que a tipografia não é apenas uma profissão, mas uma forma de ver o mundo, de resistir ao tempo e de deixar sua marca na história.

Rafael Pereira

Rafael Pereira

"Apenas letras miúdas, mas com um significado gigante." Repousa em paz, Jérôme. Sua jornada inspirou muitos a verem a tipografia não como simplesmente negrito e itálico, mas como uma ferramenta de resistência e memória.

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